Mostrando postagens com marcador Ficção. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Ficção. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

"Depois que tudo já tinha sido feito, ou antes, que nada mais pudesse acontecer”.


Sempre ouço falar do fim do mundo, e sei que a cada dia que passa ele inexoravelmente se aproxima, nunca levei isso muito a sério, na verdade brinco que adoraria assistir a tão fabuloso espetáculo na primeira fila, de preferência com vista para o mar saboreando uma água de coco bem gelada.
Outro dia fiz a mesma brincadeira com meus filhos durante o almoço, e cada um deles à sua maneira teve uma reação, nada que não fosse de se esperar de crianças, eu porém, comecei a tecer várias considerações, algumas fatalistas, outras bem humoradas, o quadro a ser pintado é algo que realmente não se poderá evitar, não há porque não encarar com naturalidade.
A cada desgraça que acontece, ou a cada nova moda inventada, ou barbaridade praticada, todos são categóricos ao afirmar, “ISTO É O FIM DO MUNDO”, talvez seja mesmo, mas é quase certo que ainda não, mesmo assim ainda quero aquele meu lugar na primeira fila com vista para o mar e com a água de coco bem gelada.
Doenças, catástrofes naturais, guerras, assassinatos com requintes de crueldade, o ser humano dando provas cada vez mais concretas de sua incapacidade de viver no planeta que habita sem destruí-lo por alguns trocados a mais, ou uma gozada que não possa ser deixada para daqui a cinco minutos, talvez fosse a última e mais mórbida diversão a ser apresentada para a humanidade, acho que até mereceríamos todos ingressos vip para assistirmos a derrocada final do homem, e o triunfo das baratas.
Neste dia do juízo final, em que inspiraríamos nossos últimos litros de ar pútrido, teríamos todos a certeza que não mais viveríamos para contar nossa história, ou para dar aquela trepada com quem tanto sonhamos, ou ainda comprar qualquer coisa, ou mesmo roubar o que por tanto tempo desejamos, não poderíamos perder tempo buscando nossos inimigos para mata-los, talvez já estivessem mortos.
Neste último e fatídico dia da humanidade sobre a terra de nada adiantaria pedir perdão, ou perdoar, ser bondoso, ou perverso, Deus talvez nem estivesse prestando atenção no que estaria ocorrendo, talvez estivesse ocupado com coisas muito mais interessantes, talvez nunca tivesse estado em qualquer lugar.
O que eu poderia fazer nesse dia, se realmente estivesse presente?
Talvez fosse realmente até a praia, beber uma água de coco bem gelada, ou ainda estivesse em casa almoçando com a família, não sei se faria nada que fosse digno de nota, ou extremamente prazeroso, ou ainda que resolvesse me afirmar como melhor que alguém neste dia em que finalmente todos nós haveríamos de inspirar nossos últimos litros de poluição, deixando todo o planeta à mercê das baratas, e de toda sorte de insetos, e vermes.
Uma só coisa me preocupava nessa minha viagem a este dia caso ele fosse realmente acontecer tão brevemente, isto não seria fácil de ser explicado às crianças caso ainda estivessem comigo à mesa, mas também não seria necessário, mesmo porque elas assim como todos nós não teríamos mais um minuto de vida sequer, eu seria poupado pela impiedosa intervenção do destino comum a todos, acho que seria inútil explicar o que não precisaria mais de qualquer explicação, a realidade seria mais forte que minhas palavras, ela sempre é.
Gostaria, no entanto de saber com seria o mundo das baratas e vermes que fatalmente tomariam conta de toda a terra, vida haveria, e quem sabe inteligência também, não sei se seria capaz de compreender sua nova ordem, sua lógica extremamente peculiar.
Imagino ainda que restaria muito lixo sobre a terra, muita sucata a se degradar com o tempo, máquinas que ainda estariam inteiras e aptas a funcionar se houvesse energia e alguém para comandar.
Computadores sem qualquer uso cheios de informações de todo tipo, ou totalmente vazios, obras de arte em museus que não passariam de um monte de material acumulado para finalidade alguma, isto também estaria a total disposição das nossas amigas baratas, dos vermes e demais seres que sobrevivessem ao fim dos tempos.
O Tempo também desapareceria, ninguém mais se incomodaria em perceber sua passagem nem registra-la com relógios e calendários, talvez sobrassem vozes, registradas em gravações, imagens daquilo que um dia esteve por lá, palavras escritas, ou faladas, mas não significariam mais nada.
Ainda assim o tempo passaria como sempre passou, indiferente à consciência de quem quer que fosse um dia nota-lo passar, e quem sabe até alguém notasse à medida que ele fosse passando.
Eu decidi então encarar o fim do mundo como um evento que se aproxima a cada dia, e coloquei meu plano de reserva de lugares em ação, mesmo porque jamais me perdoaria se não tivesse aquele meu lugar de frente para o mar, e aquela água de coco gelada nas mãos.
Trabalho com um objetivo bem claro em minha vida preciso conseguir estes lugares e aproveitar o máximo deles enquanto puder, mesmo porque não vai ter graça nenhuma se o espetáculo durar só alguns minutos, mas vai ser muito bom aproveitar desta condição enquanto o tal dia não chega, e se não chegar comigo vivo, vai ser uma pena, mas de uma certa forma cada um tem seu diazinho do juízo final quando bate as botas.
O ser humano brinca de ser Deus todos os dias, e até inventa um Deus que lhe seja útil para justificar tudo aquilo que faz, não sei se devo esperar me encontrar com esse Deus que todos falam, ele pode ser bem diferente disso tudo, posso tomar um grande susto, ou talvez não me encontrar com ninguém, mas sei que isso que tem dentro de mim e que me faz escrever tudo o que escrevo permanecerá vivo após o final de tudo, este meu “Eu Interior”, resistirá assim como as baratas, e talvez se desprendendo do tempo possa testemunhar uma história de um novo mundo a ser criado.
Não chega a ser uma obra de ficção, é apenas um pouco de maquiagem literária jogada sobre aquilo que já está acontecendo.
Nosso planeta se aquece a cada dia devido à utilização de combustíveis fósseis, mas nossa mente pode nos levar imaginar quadros tenebrosos, não custa nada tentar.
Imaginem que daqui a alguns anos vamos nos dar conta que tanto consumo de energia só pode nos levar mais rapidamente ao abismo, ainda que tenhamos muito que queimar, e temos de sobra.
A cidade de São Paulo é uma das maiores consumidoras de energia do planeta, e muitas vezes consome muito além do que necessita, imagine que um governante resolva fazer um esforço para deter este consumo desenfreado.
Aparelhos de ar condicionado seriam desativados em repartições públicas, lâmpadas seriam substituídas por outras mais eficientes, e até mesmo os hospitais seriam incluídos neste esforço, mesmo porque jamais poderia faltar energia nos grandes hospitais da cidade de São Paulo.
Tanto esforço só nos daria mais algum tempo de sobrevida, o aquecimento global ainda assim continuaria em curso, mesmo depois de algumas décadas de esforço dedicado de governantes, cidadãos e da comunidade científica, os grandes hospitais da São Paulo tomariam medidas conjuntas de controle de consumo de energia, alas que não precisassem de ar condicionado, passariam a não tê-lo, algumas outras seriam transferidas para tendas onde haveria mais ventilação e o controle de contaminação por agentes biológicos seria mais rigoroso, salas de cirurgia ainda ocupariam prédios de concreto e aço, mas salas de parto seriam mudadas para os ambientes tenda, onde seria mais fácil respirar, e ainda assim se garantir um controle de infecção hospitalar quase excelente.

Esta solução arriscada, mas plena de êxito criaria um novo paradigma a ser buscado, mesmo assim ainda estaríamos morrendo lentamente sufocados, a cada dia, e chegaria com certeza o dia em que esta solução não poderia mais ser aplicada, o ar seria tão poluído que os recém – nascidos correriam grave risco de intoxicação, e chegaria ainda o dia que ao dar seu primeiro grito para a vida uma criança haveria de consumir os últimos centímetros cúbicos de ar respirável, e morreria em seguida, juntamente com os trilhões de pessoas sobre a terra.
A maior de todas as catástrofes é o aquecimento global, pois ainda morreremos todos sem nenhum tiro ou explosão, mas pela nossa avidez de consumir qualquer r coisa que esteja à nossa disposição.
Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.



sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Árvore, Pé de Fruta, Pé de Pau, Pé de Flor (Mulher).


Árvore, Pé de Fruta, Pé de Pau, Pé de Flor (Mulher).


Inegável como a chuva que desaba do céu no verão, é a beleza da árvore que dá seu fruto, e sua flor, ou ainda não dá nada, mas se mostra a todos.

Inegável é a beleza da menina que sobe na árvore para comer a doce fruta, e é surpreendida pela chuva, sorri com toda a sua alma, seu corpo, seu ser.

Na árvore trepada sob a refrescante chuva, molhada e alimentada, uma planta de uma mulher, a planta de seu pé no galho da árvore, pé de fruta e pé de mulher.

A flor da planta desaparece, aparece regada pela chuva a flor da mulher, molhada em plena tarde de verão, sorridente e fazendo alarde, flor que pelos olhos chega na alma deste cidadão.

Se tiver fruta, ou flor, é pé de uma ou outra, se nada tem é pé de pau, mas a melhor fruta que qualquer árvore pode ter em seus galhos, traz em si a flor mais desejada pelo homem, uma morena flor de mulher.

Quantas árvores, quantos pés, frutas e flores de pernas para o ar, o homem cai por terra aos pés da mulher, ela sorri e desce da árvore comendo a fruta que pegou com suas mãos.
Anda sorridente e se vai de pés descalços sobre o chão, deixa na terra o caroço da fruta e o pobre homem, ficam no ar sua beleza e o perfume da flor molhada.

Fica a lembrança da flor e da fruta, ficam as pegadas no barro, o delicado desenho dos pés da mulher, aquela que pelos olhos tocou a alma de mais um homem que clama:

-Volta chuva, traz de volta a flor daquela planta, a moça que brotou naquele pé!
Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Branco Sobre Branco



Branco Sobre Branco

Esta história é escrita de uma forma que possa ser lida por qualquer um, mas muitas vezes as melhores histórias não aparecem neste formato, não aparecem como letras pretas sobre papel branco.

Vou contar a história de um homem, um simples pintor de paredes e de muros, todos pintados do mais puro branco, e sobre estas paredes e muros ele também escrevia histórias sobre homens e mulheres, todos seus personagens eram incrivelmente poderosos.
Albino Caiado nasceu em uma pequena cidade do interior, e como seu pai aprendeu o ofício de pintor desde tenra idade, tornou-se um mestre da pintura, e das letras também, mas de uma forma um tanto incomum.

Albino pintava tudo de branco, mas o fazia com indiscutível perfeição e, ao mesmo tempo em que pintava também deixava nas paredes por onde passava a história daqueles que um dia lhe seriam extremamente úteis, pintava tão bem com tinta branca que fora convidado para dar manutenção permanente à prefeitura da cidade onde nascera, era uma casa branca, e assim deveria ficar, igual à famosa sede do governo do país mais poderoso do planeta.
O nosso amigo pintava com gosto e com arte, o prefeito tornara-se seu confidente, e ao mesmo tempo sua primeira vítima, as confidências do nobre alcaide passaram a integrar a fachada da prefeitura, uma desgraça que não estava no orçamento do município, mas que lhe renderia seu primeiro milhão.

Começava nesse instante a carreira de um artista que seria muito bem pago para que sua obra não fosse notada ele teria, no entanto, que enfrentar alguns questionamentos para provar que não estava blefando, mas isso seria fácil de se fazer, bastaria deixar seus muros e paredes sem a devida manutenção por um tempo, isso era sem dúvida alguma a prova mais tangível de seu grande poder.

Albino conseguiu com isso uma rede de contatos muito poderosa, que o levou a uma posição invejada por qualquer vivente, foi contratado para pintar as paredes dos palácios do planalto central, e as cúpulas das casas do congresso nacional.
Dia após dia sua rede o alimentava com histórias cada vez mais interessantes, e todas elas passaram a integrar sua gigantesca e discreta obra, cada um deles trazia histórias sobre seus principais desafetos, e com isso cuidava de não ter as histórias sobre si reveladas, mas sim cobertas pelo mais puro e imaculado branco de Albino Caiado. Isso se tornou ponto de honra para deputados e senadores, ministros, generais e até para o Presidente da República.

Albino é um homem hábil e discreto, trabalha sempre com seu uniforme azul cobalto, e emprega muitos auxiliares para manter sua imaculada obra intacta, tem até mesmo verba do orçamento da união para mantê-la assim, cada gota de tinta é valiosíssima, e nenhuma delas nunca esta sobre a sua roupa, ou sobre a roupa de qualquer de seus ajudantes, são todos treinados por ele, e dominam seus segredos.

Nosso grande, porém discretíssimo artista tem atualmente feito das suas no exterior, ele foi contratado para manter impecavelmente brancos alguns prédios no país mais poderoso do mundo, um deles é o congresso nacional, e o outro é a tal da casa branca da qual falamos no início, por lá tem pintado muitas histórias, e muitas delas são muito interessantes, mas nenhuma será lida por nenhum de nós.

Albino é sem dúvida um artista ímpar, sua obra é vista por muitos, e não é compreendida por quase ninguém, apenas os eleitos têm a chance de chegar a tal compreensão, e chegam lá logo que tomam posse de seus cargos.
Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.