sábado, 15 de setembro de 2007

Dentro da nuvem


Sou de São Paulo, vivo numa cidade muito agitada, uma das maiores do planeta,muito barulho, muito trabalho, muita pressa, muita sujeira.
Nessa cidade o que não falta é fumaça e fuligem, é difícil ver um lugar onde não se tenha o motor de um caminhão, ou de um ônibus soltando aquela fumaça preta.
Uma fumaça densa como se pudesse cobrir o sol, como se a luz não pudesse penetrar.
Na verdade a cidade inteira é assim, e para nossa surpresa nossos olhos ainda vêem, podemos ver claramente o que acontece diante de nossos olhos irritados e lacrimejantes.
Fico imaginando como seria essa cidade vista de fora, assim como posso ver aquela nuvem de fumaça que sai daquele escapamento daquele monstruoso caminhão.
O ruído grave e alto de um motor incrivelmente potente, aquela baforada quente, e a fuligem que se prende ao corpo das pessoas e na carroceria dos carros que se encontram ao redor.
Agora a cidade é aquela nuvem e seus minúsculos habitantes estão todos ali, cerca de quinze milhões deles todos vivendo suas vidas naquele instante de criação, em que o motor da enorme máquina resolveu soltar aquela baforada.
O sopro divino foi o que fez sair daquela máquina todo o universo em que essas pessoas vivem, mas para muitos nada há naquela nuvem de fumaça além de simples fuligem.
Fuligem igual àquela que sai de nossas mãos depois que chegamos em casa e as lavamos na pia do banheiro.
Essa fuligem que pode ser o atestado de óbito de milhões de pessoas que se grudaram e podem ser vistas no sapato branco daquela enfermeira, que é limpo por um pedaço de flanela. Um microcosmo sem fim, bilhões de vidas que são criadas num instante e removidas da existência logo a seguir.
De fora da nuvem nada se vê, porém lá dentro esse drama é real, a vida desses minúsculos seres é tão vida quanto a nossa própria vida. Será que somos nós tão minúsculos quanto eles?
Será que somos tão grandes que não conseguimos percebe-los no meio da nuvem que vive toda uma história num instante tão fugaz quanto a passagem daquele caminhão que deixou aquela fuligem toda na porta daquele carro ali na frente?
Chego a uma só conclusão, se nos importamos com a vida é porque somos pequenos o suficiente para vive-la, se ignoramos a sua existência é porque somos grandes demais para percebe-la.
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